
Acreditar não é fácil. Não é fácil para o arqueólogo, para o historiador, para o biólogo, para o teólogo ou para o ateu. Não me refiro a acreditar naquilo que pode ser visto, o que às vezes também provoca dúvidas, mas especialmente a crença no invisível, na suposição, na teoria, na interpretação de fatos não muito claros.
Admito que já duvidei. Duvidei de coisas que sempre cri. Mas no auge doloroso da minha dúvida, lembrei de outros que, como eu, também passaram pelo processo incômodo de questionar o que parece fato aos olhos da maioria.
Madre Tereza de Caucutá, alguém que dispensa apresentação, pediu para que as centenas de cartas enviadas aos seus conselheiros espirituais fossem destruidas, mas não foi atendida e as cartas viraram livro. Suas declarações revelam o sofrimento pela incapacidade de acreditar totalmente: “Dizem que Deus vive em mim; contudo a realidade da escuridão, frieza e vazio é tão grande que nada toca a minha alma. Sinto apenas aquela terrível dor da perda, de Deus não me aceitar, de Deus não ser Deus, de Deus não existir realmente.”
Alguns podem estar surpresos pelo ceticismo temporário de Tereza. Mas outros, tão ou mais santos que a caridosa serva de Deus, passaram por momentos de dúvida.
Davi, o homem segundo o coração de Deus, desconfiou da companhia do senhor que prometeu estar ao lado dos Seus filhos (Sl 10:1); Tomé, um dos 12 mais próximos seguidores de Jesus, duvidou do Mestre ressurreto (Jo 20:25); João Batista, o maior entre os nascidos de mulher, duvidou do fato de Jesus ser o Messias enviado (Mt 11,2). E a lista segue numerando diversos outros que tiveram suas sinceras dúvidas registradas na bíblia.
Não acho que apenas os cristãos duvidam. Seguidores de outras religiões devem também ter seus momentos de incredulidade. O que parece é que quando se questiona a doutrina, o dogma, o princípio ou simplesmente uma convenção, passa-se a imagem de fraqueza ou revolta. Assim é melhor guardar a dúvida em um canto escondido do pensamento, longe dos olhos e dos ouvidos dos críticos porque parece que apenas os sinceros-ingênuos admitem a dúvida. Ter muitas certezas denota força, equilíbrio, superioridade. Mas quando vejo pessoas assim sempre lembro da Cantiga por um ateu, do Padre Zezeinho: Às vezes, quem duvida e faz perguntas, É muito mais honesto do que eu. ...
Também acredito, que mesmo os céticos passam pelo dilema da dúvida. Charles Darwin quase entrou em parafuso ao concluir, a partir da sua turva observação, que nós, seres incrivelmente complexos, somos, segundo ele, descendentes de um ancestral do macaco.
Não creio que nunca passou pela brilhante mente de Stephen Hawking, dúvidas a respeito da incoerente teoria do Big Bang.
Também duvido que Richard Dawkins, o ateu-biólogo implicante, não tenha sofrido de dúvida ao sugerir que as baleias eram ursos que, ao nadarem em busca de comida, foram ficando por lá até se tornarem os gigantes mamíferos dos mares.
Em que acreditar e por que acreditar?
O cardápio de crenças é incrivelmente diverso. Há os que creêm em reencarnação, há os que creêm em alienígenas, os que acreditam que o peixe espada virou elefante, os que afirmam que Elvis não morreu e os que acham que em 2012 o mundo vai acabar. A lista de convicções é extensa, os irmãos católicos por exmplo, acreditam que cerca de 5.120 santos estão à sua disposição para cuidar de dores abdominais, vendedores de armas, ferreiros e os que são acometidos de problemas intestinais.
Diante de tantas ofertas de crendices, crenças e credos. Nos resta concluir que acreditar é uma escolha. Às vezes uma escolha imposta pela tradição, pela comunidade acadêmica, pelos pais ou pela igreja, mas é uma escolha.
Por isso, a despeito dos momentos de dúvidas, eu escolhi acreditar naquilo que me pareceu coerente e significativo. Naquilo que trouxe satisfação para minha mente. Procurei utilizar o bom senso, a sobriedade, a racionalidade e às vezes o sentimento para dizer: Eu creio!
Sim sou um cético! Desconfio, duvido, questiono, digo às vezes que não sei. Mas procuro não deixar que minhas dúvidas comprometam a minha fé. Assim, quando a dúvida incomoda, ameaça, grito para o autor da fé como um anônimo personagem bíblico: Eu creio, ajuda-me em minha incredulidade (Mr 9.24). Então busco conviver com as incertezas inevitáveis da vida e com as as verdades que o Senhor me convenceu a acreditar.
2 comentários:
texto lindo!!! ei, tô com saudades de vcs!!! beijo amo vcs!!!
Obrigado César. Inspirador!
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